"A "maldição" havia nascido duas vezes. Na primeira, em 1935, foi batizado com um nome de branco. Para agradar aos pastores protestantes, seu pai o chamou Hildegart. Inconformado em receber o nome do conquistador, o recém-nascido abandona seu corpo para voltar três anos depois e, aí sim, permanecer entre nós com o nome com o qual o mundo o conheceria: Fela (aquele que emana grandeza). Fela Kuti
Um nome é o que Fela nos ensina desde o primeiro momento: uma questão de vida e de morte. Um nome carrega o destino, aponta a direção. Diz o que se quer e o que se fará no período das nossas curtas existências. Nosso grupo de pesquisa se chama Ilè Òbá Òyó. Na língua Yorubá, que era também a língua de Fela, este nome significa A Casa do Rei de Òyó, que é Xangô, Orixá associado à justiça. Em nossa casa no ProPEd – Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ – nos reunimos semanalmente para tentar compreender o racismo, as aprendizagens das crianças do Candomblé nos cotidianos dos terreiros e a discriminação religiosa na escola. Como a África, em toda a sua pluralidade, tão duramente invisibilizada ao longo da história, se faz presente nas mais variadas redes educativas que nos formam? Essa é uma das nossas questões. Dedicamo-nos a conhecer novas bibliografias, novas referências para nossas pesquisas, dentro e fora do espaço acadêmico.
Um filho da
África, inventivo e militante. Fela Anikulapo-Kuti criador
do Afrobeat nos anos 70, é uma
inspiração para quem luta contra o racismo e deseja compreender a presença da
África no mundo e na formação do Brasil. Sua música, expressão de sua vida de
resistência e de lutas, sintetiza, nas palavras de Sueli Carneiro ao apresentar
a biografia autorizada de Fela escrita por Carlos Moore, a experiência
histórica dos africanos e afrodescendentes espalhados pelo mundo pela brutal
escravização e colonização. A música de Fela é uma denúncia das consequências
dessa experiência no presente.
Do encontro
das buscas do nosso grupo de pesquisa com Fela, emerge um forte desejo de novos
diálogos que ganhou, gradualmente, o formato do evento que apresentamos aqui.
Fela estará presente em todo o Seminário, nos diálogos e nas diferentes
atividades, por meio da inspiração em sua vida de militância e em sua música
que, segundo alguns críticos, impõe respeito às lutas que ele abraçou e
personificou pela justiça.
Fela é a África que incomoda a todos aqueles que a querem
domesticada e submissa aos interesses das classes dominantes. Conhecer e
refletir sobre este artista criativo, contraditório e indomável é um passo
essencial para que conheçamos um pouco mais deste continente rico e complexo.
Conhecer a África faz parte da necessidade inadiável de procurarmos conhecer a
nós mesmos.
A música de Fela nos convoca a movimentar o corpo e a
mente. Ela imprime o ritmo de ideias e de práticas de ousadia e de
transformação. Fela, seu Afrobeat e o
Alujá, que é um toque e uma dança consagrada ao Orixá Xangô, embalam nosso
desejo de aprender e de contribuir para novos encontros e para mudanças. Com
essa inspiração, convidamos todos e todas para dialogar conosco e com nossos
convidados no I Seminário Fela Kuti da
UERJ: a educação, os movimentos sociais e a África que incomoda, nos dias
13, 14, 16 e 17 de outubro de 2014.